4 Outubro, 2022
Enfermeiros perderam em média 17% do poder de compra entre 2010 e 2022
A proposta apresentada pelo Governo para os aumentos na Administração Pública mantém a lógica da perda de rendimentos e de poder de compra, afetando os enfermeiros e demais trabalhadores.

 

É inaceitável que o Governo afirme que a sua proposta encerra uma valorização global de 5,1%, quando neste valor inclui o aumento de 52 euros até à posição remuneratória n.º 41, percentagens de aumento entre 2% e 8% e a admissão de 15 mil trabalhadores.

É inaceitável que a proposta do Governo proponha aumentos de 2% para trabalhadores com salário bruto acima dos 2700 euros, penalizando-os duplamente, já que são estes que também pagam mais IRS, face à progressividade deste imposto.

Finalmente, ainda que os impactos das medidas do Governo possam atingir os cerca de 1,2 mil milhões de euros, prevê-se um retorno aos cofres do Estado de cerca de metade daquele valor depois da dedução dos impostos.

 

A evolução das remunerações dos enfermeiros entre 2010 e 2022 na Tabela Salarial da Carreira

Determinava-se em 2010 para os enfermeiros uma remuneração base média mensal ilíquida de 1.462 euros. Deduzindo à remuneração base média mensal ilíquida os descontos obrigatórios para a Caixa Geral de Aposentações/Segurança Social (11%), ADSE (1,5%) e IRS (ex.: casado com 1 filho), obtém-se a remuneração base média mensal líquida de 1.075 euros.

Em 2022, a remuneração base média mensal ilíquida dos enfermeiros é de 1.557 euros. Deduzindo os descontos obrigatórios para a Caixa Geral de Aposentações/Segurança Social (11%), ADSE (3,5%, a contribuição para a ADSE aumentou 133%), e IRS (ex.: casado com 1 filho), a remuneração base média mensal líquida é de 1076 euros.

Em doze anos, entre 2010 e 2022, a remuneração base média mensal líquida dos enfermeiros aumentou 95 euros (passou de 1.462 euros para 1.557 euros), e a remuneração base média mensal ilíquida aumentou, em termos nominais, apenas 1 euro (passou de 1.075 euros para 1.076 euros). 

Deduzindo às remunerações ilíquidas, o aumento de preços entre 2010 e 2022, as conclusões ainda serão mais chocantes.

Considerando que os preços aumentaram 20,4% entre 2010 e 2022 (valor que inclui a subida de preços de 8% este ano), a remuneração base média mensal líquida de 2022 (a preços de 2010) é de apenas 889 euros, ou seja, diminuiu -17%, isto é -185 euros.

O quadro seguinte apresenta para todas as categorias e escalões a remuneração base ilíquida (em 2010 e 2022), a remuneração base líquida (ex: casado com 1 filho após descontos para a CGA/SS, ADSE e IRS ),em 2010 e 2022), ambas nominais, e ainda a remuneração base líquida de 2022 a preços de 2010 (valores reais). Sistematiza também a redução, em percentagem e em euros, do poder de compra das remunerações de 2022 face a 2010.

 

SEP | Perda rendimentos enfermeiros

A base da carreira especial de enfermagem inicia-se na categoria de Enfermeiro, nível 15 da Tabela Remuneratória Única. Em 2010, a remuneração ilíquida fixava-se  em 1.201 euros e, em 2022,  1.216 euros. Em 12 anos aumentou 14 euros.

A remuneração líquida (ex.: casado com um filho, após descontos para a CGA/SS, ADSE e IRS ) era de 931 euros em 2010 e de 890 euros em 2022, o que totaliza uma diminuição de 42 euros.

Contudo, ao descontarmos o aumento de preços verificado nestes 12 anos, a remuneração líquida de 2022 (890 euros) a preços de 2010 passa para 735 euros, o que resulta numa diminuição de 21% e -196 euros face à remuneração de 2010, em termos reais.

Verifica-se em todos os níveis da carreira especial de enfermagem  uma diminuição do poder de compra das remunerações líquidas de 2022 face às de 2010, variações que em percentagem se situam entre -20% e -24%, e em euros entre -196 e -512 euros (nível 57).

Conclui-se, assim, que o poder de compra das remunerações líquidas (após descontos p/ CGA/SS, ADSE e IRS) da tabela da carreira especial de enfermagem, deduzindo o efeito corrosivo do aumento de preços é, em 2022, significativamente inferior à de 2010:

  • Categoria de Enfermeiro: diminui entre 20% e 23% e em euros -196€ e -425€;
  • Categoria de Enfermeiro Especialista: diminui entre 20% e 23%, e em euros -207€ e -417€;
  • Categoria de Enfermeiro Gestor: diminui entre 21% e 24% e em euros -328€ e -512€

 

Quando um dos problemas do SNS é a dificuldade na retenção de enfermeiros, face ao exposto, torna-se percetível pelo menos uma das razões. Mais: este problema manter-se-á com a atual proposta de aumentos salariais do Governo,  ou seja, não é verdade que estejam a ser adotadas medidas para atrair profissionais qualificados e, mais importante, que se mantenham na esfera da Administração Pública, em concreto no Serviço Nacional de Saúde.