30 Abril, 2015
DL nº 30/2015 – “Municipalização” da Saúde

Posição do SEP

O governo fez publicar o DL nº 30/2015, de 12 de Fevereiro, que estabelece um regime de delegação de competências nos municípios e entidades intermunicipais, nas áreas da saúde, da educação, da cultura e da segurança social, habitualmente designadas como funções sociais do Estado.

Este mesmo governo já havia legislado através da Lei nº 75/2013, de 12 de Setembro, o regime jurídico da transferência de competências do Poder Central, para as Autarquias Locais e para as entidades intermunicipais.

Com a legislação agora publicada e particularmente no domínio da Saúde, são delegáveis nos órgãos dos municípios e das entidades intermunicipais, competências até agora assumidas pelo Poder Central, tal como determina a Constituição da República Portuguesa, que no seu Artigo 64ª, define: “O direito à protecção da saúde é realizado: …Através de um serviço nacional de saúde universal e geral…” e “Para assegurar o direito à protecção da saúde, incumbe prioritariamente ao Estado: …Garantir uma racional e eficiente cobertura de todo o país em recursos humanos e unidades de saúde”.

É neste contexto que o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses, não pode deixar de questionar as consequências desta política descentralizadora de competências do Estado nas Autarquias locais, num quadro em que muitas enfrentam sérias dificuldades devido ao endividamento acentuado e aos cortes orçamentais impostos pelo Governo, numa estratégia de destruição das funções sociais do Estado, prosseguida pelos sucessivos governos.

Estas questões suscitaram uma profunda reflexão por parte do SEP, atendendo ao processo que tem vindo a ser traçado por este executivo, de comprovado desinvestimento no Serviço Nacional de Saúdecomprometendo o seu carácter universal e tendencialmente gratuito e clara degradação das condições de trabalho dos profissionais de saúde e particularmente pelos sucessivos e indignos ataques à Carreira de Enfermagem. É este mesmo governo que pretende, agora, ser o protagonista desta descentralização de competências e particularmente da gestão de recursos humanos, de infra-estruturas e demais recursos materiais, dos Cuidados de Saúde Primários (CSP).

Tendo em conta estes pressupostos, a Direcção Nacional do SEP reunida em 4 de Março de 2015 analisou:

  • Os Cuidados de Saúde Primários têm como missão prioritária a promoção da saúde e a prevenção da doença;
  • Nos últimos anos constatou-se o encerramento de Serviços de Atendimento Permanente dos Centros de Saúde sem que tenham sido garantidas as ajustadas respostas às necessidades dos cidadãos. Por outro lado, é reconhecida a grave carência de recursos humanos, de todos os grupos profissionais;
  • Apesar de ser uma exigência desde a sua criação, nunca foi atribuída autonomia financeira aos Agrupamentos de Centros de Saúde e os cuidados de saúde primários têm permanecido numa constante situação de subalternidade relativamente aos cuidados hospitalares;
  • Esta evidência está bem patente nas opções dos sucessivos governos no momento da alocação de recursos, designadamente, orçamentais; quando se verifica uma diminuição continua das verbas do orçamento de estado para a saúde em geral, e para a promoção da saúde em particular; como também se constata através da diminuição, nos últimos 3 anos, da quantia per capita/cuidados de saúde primários, nas Unidades Locais de Saúde;
  • Não há hoje qualquer evidência que demonstre que esta “descentralização de competências” para as autarquias possa vir a melhorar a acessibilidade dos cidadãos aos cuidados de saúde e permita dar as respostas integradas e articuladas às necessidades identificadas;
  • Face ao referido e conhecido endividamento das autarquias, os cidadãos podem estar confrontados com uma oferta de cuidados diferenciada e, nomeadamente, dependente dos recursos financeiros disponíveis por cada uma das autarquias, colocando em causa o principio constitucional de Direito à Protecção Saúde.

No quadro da análise destes pressupostos a Direção Nacional do SEP opõe-se à “municipalização” consagrada no referido Decreto-Lei, porque considera:

  • Que o SNS continua a ser a componente estruturante do Sistema de Saúde Português e, enquanto pilar da organização dos cuidados de saúde, é o dispositivo concretizador da garantia constitucional do Direito à Protecção da Saúde;
  • Que o acesso à Saúde não pode estar dependente de factores alheios aos contribuintes, isto é, todos os portugueses contribuem através dos impostos para o SNS, num regime de solidariedade, que permitiu a melhoria dos indicadores de saúde;
  • Que as instituições integradas na área dos Cuidados de Saúde Primários, entre outros aspectos, devem ter autonomia de gestão e financeira e devem assumir um papel preponderante enquanto prestador público e articulador das respostas em saúde, com os vários actores locais, em função das necessidades localmente identificadas;
  • Que para estes objectivos devem, entre outras medidas, ser admitidos os necessários recursos humanos, dos vários grupos profissionais.